ThiagoDamasceno: Crônica - Eu Apenas Não Disse

domingo, 4 de dezembro de 2011

Crônica - Eu Apenas Não Disse


“É melhor um bom amigo que cem parentes”
(Provérbio italiano)

Eu Apenas Não Disse

Por Joana Bezerra,
Crônica especialmente dedicada à Lu

Goiânia, 18/10/10

        Amo viver. Por mais que eu pense sempre na possibilidade, odeio a idéia de morrer, mas às vezes a existência se mostra tediosa, cansativa, angustiante. As surpresas mudam as coisas para melhor ou para pior. No meu caso, mudou para melhor, porque hoje me deparei com uma surpresa excelente.
       
        Uma amiga minha, vinda do estado da música excelente, Minas Gerais, me ligou dizendo que chegava dentro de poucas horas. Ela se atrasou, mas chegou. Veio à minha casa, fomos procurar uns livros para comprar, conversamos sobre várias coisas, comemos pizzas e fomos ao cinema. Uma programação que começou na metade da tarde e foi quase até a meia-noite.
       
        Na volta, enquanto a acompanhava até o seu prédio, fiquei pensando no que dizer a ela. Eu queria dizer que ela deu uma espécie de sopro nas minhas narinas, me fez sentir amada. Fez questão de me ligar, me ver, sair, conversar. Isso não acontece todo dia, principalmente nesses dias tediosos onde nem as canções preferidas nos animam e a arte se torna apenas arte. Nesses dias tediosos a saudade de um passado mais real que idealizado povoa meus sentimentos. Além disso, os crimes estão nos jornais, o crack circula pelas ruas, os políticos usam a religião nas campanhas, a raça humana se mostra com o pé na lama, enfim, esses dias em que se perde sete vidas a cada minuto. Podemos criticar, podemos rir para não chorar, mas nem só de críticas e gargalhas se faz um dia. Também quero lembrar da amizade. Por mais que o mundo caminhe para o caos, a amizade ainda existe nos povoados, pequenas cidades, capitais e repentinamente, em qualquer lugar e tempo.
       
        Eu queria dizer a ela tudo isso e mais um pouco. Dar-lhe um abraço, um beijo na testa, um olhar no seu olhar. Não sei quando nos veremos de novo. Eu queria dizer, mas não disse. Trocamos poucas palavras na porta do seu prédio e nos abraçamos. O que falamos foi uma espécie de breve adeus, pois dentro de poucos dias ela estaria de volta à sua cidade. Fiquei pensando quando teríamos um dia especial como hoje, magnífico e belo na sua simplicidade. Espetacular, assim... Meio que de repente, sem mistério. Eu queria dizer “obrigado”. Eu queria dizer, mas não disse. Ela entrou. Não sei se não falei por que ela estava com sono, ou se eu estava com sono, ou se não falei por timidez ou vergonha. Eu apenas não disse.
       
        Voltei para casa caminhando, observando cada rua. O ar noturno das cidades cheira a medo. Não aconteceu nada. Um rapaz me parou perguntando onde pegaria o ônibus para Senador Canedo, uma cidade vizinha. Os ônibus não estavam mais passando àquela hora. Entrei no meu prédio. Deixei o cara lá. Não o conhecia. A desconfiança falou mais alto que a moral solidária cristã. Fiquei pensando em um trabalho que eu teria para explicar amanhã na aula de Português, no belo filme que vimos, no sujeito de Senador Canedo que ficaria nas ruas, enfim, fiquei pensando em todo o mundo lá de fora, mas preferi o mundo controlado e seguro do meu quarto e decidi escrever tudo que eu queria dizer para ela, mas não disse. Uma pessoa, em alguns momentos, pode mudar seu dia e sua maneira de ver as coisas. Foi isso que ela fez comigo.
       
        Eu queria dizer tudo isso, mas não disse. Será que fui covarde? Medrosa? Será que todas as coisas que se pensa devem ser ditas? Será que alguém achará tudo isso uma tolice ? Será que alguém achará essa declaração linda? Filosófica? Poética? Amorosa? Fraternal? Egoísta? Não sou a dona dessas respostas.
       

Nenhum comentário:

Postar um comentário