ThiagoDamasceno: 2013

terça-feira, 29 de outubro de 2013

Poema: O Céu É O Limite?

O Céu É O Limite?



O arroz subiu
O feijão subiu
A farinha subiu
A fome subiu

Só não sobe minha barriga cheia

O gás subiu
A água subiu
A luz subiu
O aluguel subiu
Os juros compostos se amontoam
Na fila das dívidas

Só não o sobe o meu salário

O dízimo subiu
A oferenda subiu
Jesus Cristo subiu
E cobra tudo lá de cima mesmo

Só não sobe minha bem-aventurança

O suborno subiu
A traição subiu
Ter esperança, às vezes, dói
E o remédio subiu

Só não sobe minha imunidade

A gasolina subiu
O IPTU subiu
E o meu carro sumiu

E meus pés, onde ficam?



Thiago Damasceno

terça-feira, 24 de setembro de 2013

Crônica: A Francesa e o Transporte coletivo Goianiense

A Francesa
e o
Transporte Coletivo Goianiense
Por Thiago Damasceno

            Estava eu voltando das minhas andanças urbanas e entrevistas domiciliares pelo IBGE, esperando um ônibus inchegável no Terminal Bandeiras, zona conhecidíssima de Goiânia, quando me deparei com uma curiosa senhora.
            Eu ouvia Dire Straits via fones de ouvido quando fui arrebatado do meu êxtase roqueiro pela dedada da curiosa senhora. Ela tinha olhos indagadores e uma cabeça que procurava mistérios insolúveis pelo ar.
            Falou em uma língua estranha. Não entendi. Perguntei se ela falava português. Não entendeu. Sorriu. Juntei toda minha coragem e erudição aprendida em cursos rápidos de inglês e destilei meu veneno:
- Do you speak English?
            Ela fez um gesto veemente de “não” com a cabeça. Pelo que vi, ela entendia um pouco, e falava um pouco menos pouco ainda.
            Então ela começou a falar na língua dela que eu não compreendia. Me expressei em duas línguas pra lhe demonstrar que não entendi. Primeiro disse “I don´t understand”, e depois fiz o sinal de LIBRAS, pondo a mão na cabeça, balançando mão e cabeça e fazendo uma expressão facial de dúvida. Aí ela entendeu. Gestos são mesmo universais.
            Palavras soltas e isoladas vão, palavras soltas e isoladas vêm, fomos até a placa informativa sobre as linhas de ônibus. Com mais algum esforço, entendi que nossa turista estrangeira queria pegar a linha 004, que passa pelo Setor Central. Meu destino era o mesmo. Ela estava no lugar certo pra embarcar, mas foi só eu tentar fazer mais perguntas, querendo saber onde exatamente ela iria descer, que a coisa piorou.
            Foi quando ela fitou o local vazio que deveria ter um ônibus, cruzou os braços com aflição e disse uma palavra elegante (para aquele contexto) que resume toda a situação da maioria dos goianos que dependem do transporte coletivo:
- “Difícil”.
            Pronunciou perfeitamente. E ainda disse (mais ou menos) que o português era difícil por causa da pronúncia. E disse mais coisas em francês.
            Depois ela tentou me comunicar mais coisas. Pegou um dicionário bilíngue meia-boca, mas não rolou. Outra vez, estufei minha verborragia pseudo-poliglota nos seguintes termos:
- Háblas Espanõl?
            Também não deu certo. Ela falava élfico e línguas extintas da antiga suméria, menos português, inglês ou espanhol. Então olhei melhor pra sua aparência: branca, loira, olhos claros... E cuspi-lhe mais verborragia internacionalística:
- Where are you from? Europe?
- Yes, French.
            Finalmente alguma compreensão puramente verbal! Ela entendia muito pouco, mas deu pro gasto. Foi nesse momento de alegria mútua, que ela começou a pronunciar repetidamente:
- Mercy.
            Tentamos mais algumas orientações.
- Mercy.
            Tentei ajudá-la mesmo.
- Mercy.
            Até insisti de novo, vagarosamente:
- Se-eu-falar-em-português-bem-devagar-você-me-entende-?
            Disse que não. E não parava de mercyzar. O ônibus chegou e ela entrou correndo. Ainda perdida. Foi cômico ver ela de pé, tentando se equilibrar e se segurar nas barras do ônibus, no meio do chacolejar constante.
            Minutos depois ela reconheceu onde tinha que descer, apertou mil vezes o botão de parada antes de eu avisar que tinha dado certo, e desceu. Desceu sorrindo e dizendo:
- Mercy!
            Eu falei um “Good bye!”, pensando na sua perfeita pronúncia de “Difícil”.
            É... pegar ônibus no Brasil não tá fácil pra quem é brasileiro de puro sangue mestiço, imagine pra quem é francês e vem parar no país sem saber português, espanhol ou inglês...


See you soon!

terça-feira, 10 de setembro de 2013

Crônica: Como os Fantasmas Estragam Uma Metamorfose

Como os Fantasmas Estragam Uma Metamorfose

Por Thiago Damasceno


Após algumas mortes na família (incluindo meu cachorro), volta às aulas a mil por hora depois de uma greve de três meses, manifestações pelo Brasil afora, aprovação em um concurso público, boas ideias na cabeça pra um bom romance juvenil, conclusão da graduação chegando, novas escolhas pra minha carreira acadêmica, a consolidação de um grande amor, uma viagem muito massa à verdadeira capital do país (São Paulo), e o anúncio de Bell Marques sobre sua saída do Chiclete Com Banana... volto a blogar, trazendo o equilíbrio à literatura cronística cerradense, conforme reza a Profecia...

            Meus dedos ficaram um tempão sem apalpar as teclas, mas andei desenvolvendo meus pensamentos entre ônibus lotados e pedras pelo meio do caminho. E assim, tem horas que percebemos que mudamos tanto que olhamos pra trás e nos sentimos estranhos em uma terra estranha, ou “desterrados em nossa própria terra”, como diz Sérgio Buarque de Holanda em Raízes do Brasil.

            Brasileiro desbrasileirado ou não, gosto de ver umas coisas como antes, no seu devido lugar. Isso conforta a mente. E sim, podem me chamar de conservador, nesse ponto. Meu inconsciente me mostrou algo desse (des)conforto em um sonho que tive indo pra agitada e cosmopolita São Paulo.

            Sonhei que estava descendo as escadas do meu prédio e me deparei com três pequenos vultos. Percebendo que eram crianças, corri pra assustá-las, mas elas avançaram e então vi que as três estavam mortas. Não eram zumbis, como prega a moda. Eram fantasmas. Corri delas com muito medo. Justamente: medo. Tenho medo de fantasmas. Sempre tive. Os das estórias e os aparentemente reais. Se tem uma coisa que me dá medo são os ditos cujos fantasmas. Serial killers chegam a ser menos maléficos pra mim.

            O bom disso, tirando o banal e incipiente exercício freudiano, é que claramente meu medo infantil permanece. Ainda tenho um pé em algo firme e antigo, como todo mundo. E como o próprio mundo.

Sonho e escrevo em letras grandes, de novo
Pelos muros do país
John, o tempo andou mexendo com a gente...

(Belchior)


quarta-feira, 10 de julho de 2013

Crônica: “Bênça, Vô?”

“Bênça, Vó?”


Por Thiago Damasceno,
De Goiânia, na madrugada de quarta-feira (10/07/13)


“Eu hoje tive um pesadelo e levantei atento, a tempo
Eu acordei com medo e procurei no escuro
alguém com seu carinho e lembrei de um tempo
Porque o passado me traz uma lembrança do tempo que eu era criança
E o medo era motivo de choro, desculpa pra um abraço ou um consolo (...)

De repente a gente vê que perdeu ou está perdendo alguma coisa
Morna e ingênua que vai ficando no caminho,
Que é escuro e frio, mas também bonito porque é iluminado
Pela beleza do que aconteceu há minutos atrás”.

(Poema, letra de Cazuza dedicada à sua avó)



            Se há pessoas importantes na nossa vida que não lembramos da primeira vez as vimos, são nossos avós. Pelo menos eu não lembro da primeira vez que vi minha avó materna, Docina Damasceno.

E a primeira lembrança que esse nome me traz é de uma senhora já senhora desde que me entendo por gente, dona de uma casa enorme, com um grande quintal, maior até que qualquer imaginação infantil, um quintal cheio de bichos e plantas e areia e tudo que faz uma criança voltar suja pra casa, pro desespero da mãe. Enfim, descrevi um pouco da famosa instituição brasileira (ou mundial) denominada “Casa da Vovó”, onde se pode tudo. “Casa da Vó” quando ficamos mais velhos e aparentemente tão maduros quanto as frutas do quintal da vovó.

A Casa da Vovó é uma zona de refúgio inabalável. Pra lá que íamos (e vamos) quando as coisas não vão bem em casa. Quando mãe e pai estão em pé de guerra com o filho, este, sendo simultaneamente neto, encontra na figura vótriarcal segurança absoluta ou intermediação e solução pra todos os conflitos. Creio que se todos os chefes de Estados ou diplomatas fossem vovós, o mundo estaria em paz.

Aprofundando a ideia do primeiro parágrafo, as origens dos avós também são nebulosas. Eles parecem arquétipos de mitos universais, estórias cujos tempos não são precisamente datados, acontecendo no Era uma vez... O pouco que sei é que vovó Docha nasceu e foi criada no sertão maranhense, sobrevivendo da terra. Casou bem cedo com o homem que queria e manteve-se firme e forte no matrimônio por 70 anos. Converteu-se ao protestantismo e manteve-se nessa fé até o último fôlego de vida ter saído de suas narinas. Teve 10 filhos, 42 netos, 71 bisnetos e vivia satisfeita, temendo o seu fim com respeito e certo bom humor à la nordestina. Como ela sempre comentava: “Eita, que a véia tá se acabando, meu Deus!”.

Fim que também comentou da última vez que nos falamos por telefone, num domingo próximo. E agora há pouco, outra ligação nos informou do seu falecimento por causas naturais, na sua cidade atual, no interior do Maranhão. Como seu neto mais bonito, inteligente, criativo e querido, faço aqui minha pequena homenagem. Impossível não associá-la com Úrsula Iguarán, matriarca da famosa “casa de loucos” do romance Cem Anos de Solidão. Porém, tais comparações não são totalmente precisas, pois a vida real supera a vida ficcional, obviamente também no campo das emoções. Há palavras que expressam sinceramente a saudade?
  
A saudade fica, junto com a tristeza, mas com elas, a persistente memória, aquela musa do Olimpo que não nos deixa esquecer os entes queridos... muito menos a insuperável Casa da Vovó!

- Para de enrolação, menino! Rum, toma jeito! Pede bênça pra tua vó!


-Tá bom... bênça, vô?


segunda-feira, 24 de junho de 2013

Política: Pelo Direito de Protestar!


Pelo Direito de Protestar!
Por Rodrigo Specterow
Nas últimas semanas, Goiás, Brasil e o mundo têm visto diversas manifestações civis, anárquicas (ausência de líderes) e apartidárias criticando inicialmente o aumento abusivo no preço das passagens do transporte público. Tais manifestações tomaram força e se expandiram e conquistaram mais apoios diante da truculenta repressão da polícia e se somaram a outras causas, como em Goiás, na greve da sucateada UEG (Universidade Estadual de Goiás). No restante do país, se clama por saúde e educação de qualidade; na Turquia, os manifestantes estão por todas as partes e se recusam a deixar uma praça que o governo teima em reformar; e em todos os casos a mais veemente das afirmações: temos o direito de PROTESTAR!

Passeata pela UEG (16/05/13)

Vivemos em uma democracia onde a liberdade de expressão é garantida na Constituição, entretanto, os governantes e até a Justiça parecem ignorar isso. Em Minas gerais, a Justiça decidiu que não se pode protestar; em São Paulo e no Rio de Janeiro, a polícia desceu o porrete até em jornalista; em Anápolis-GO, dois estudantes da UEG foram presos por protestar na presença do governador (sexta-feira, 14 de junho); na Turquia, quatro manifestantes morreram em protestos contra o governo e nos EUA, que se acham o berço dos valores democráticos, Edward Snowden, um americano que decidiu não se calar e expor para todos que o governo americano espiona até seus próprios cidadãos, pode ser condenado à prisão perpétua.

O mundo mudo, o país mudo, a sociedade não pode e não aceita que o Estado lhe imponha o que fazer. Nas democracias todo poder emana do povo e em seu nome tem que ser exercido. Caso contrário, se perde toda e qualquer legitimidade que possa algum dia ter tido. Os jovens anseiam em participar das decisões políticas que podem mudar os rumos da nação – e nada mais justo que isto seja feito pelos protestos!

terça-feira, 18 de junho de 2013

Crônica Social: Pelas Ruas Que Andei II

Pelas Ruas Que Andei
Crônicas Sociais

II

                Antes de iniciar esta crônica, algumas considerações...
           
            Publico-a mais de um mês depois dos seus acontecimentos narrados por motivos simples. O primeiro é que as informações principais da crônica estão relacionadas à passeata pela UEG feita no dia 16 de maio. No mesmo dia também houve uma manifestação contra o aumento da passagem do transporte coletivo. Ao escrever o texto, tentei destacar igualmente os dois protestos e acabei me embananando com o tamanho que a crônica adquiriu mais a necessidade de ter informações seguras e atualizadas. O segundo motivo foi a motivação que me veio com os protestos simultâneos no país, ocorridos em São Paulo, Rio de Janeiro, Brasília e Belo Horizonte em 17 de junho. Vendo tais movimentos, editei a crônica.

            De fato, o pontapé inicial desses protestos foram os aumentos das passagens dos ônibus urbanos em todo o país. Com a festividade da Copa das Confederações e outros futuros eventos esportivos que sediaremos mais nossos clássicos problemas em setores públicos, as manifestações cresceram e têm várias reivindicações, mas apesar dessa heterogeneidade, mostram uma coisa, por mais óbvia que seja: O brasileiro é insatisfeito com seus (ou quem deveria ser seus) representantes políticos.

            A crônica seguinte é sobre parte dessa insatisfação. Admito que após essa passeata, minha participação no movimento da greve tem sido praticamente nula. Logo, para mais informações (e muitas mesmo) recomendo o acesso ao blog http://movimentomobilizaueg.blogspot.com.br, pois muitas coisas aconteceram desde essa passeata, incluindo bloqueio de rodovias a prisão de estudantes.


Passeata Pela UEG (16/05/13)

Por Thiago Damasceno,
nordestinamente de Goiânia, um pouco depois do calor dos acontecimentos

            “Hoje eu acordei com sono e sem vontade de acordar”. Eu e uma galera acordamos assim hoje, como canta Cazuza em Bilhetinho Azul. Contudo, vencemos a clássica preguiça matinal e demos as caras nas ruas pra participar de mais um ato pela Universidade Estadual de Goiás (UEG) durante sua greve. O ato foi, nada mais nada menos, caminhar em protesto do Terminal Padre Pelágio até a Praça Cívica, centro administrativo da capital e do estado. Pra quem não conhece, uns 10 km de sebo nas canelas. Pra quem conhece um “Sol arregalado”, como diz minha mãe, 10 km caminhados sob um Sol arregalado.


Foto: Gilberto Aquino


          Umas oito e meia da manhã desci do meu prédio e fui pegar o Eixão até a o Terminal Padre Pelágio. Na Avenida Anhanguera, por onde transita o Eixão, quase encontrei mais uma manifestação contra o aumento da passagem do transporte coletivo, tema de uma crônica anterior. Essa passeata há alguns metros de onde eu estava, também feita majoritariamente por estudantes, perturbou o trânsito, mas os Eixos encontraram outros caminhos e após alguns minutos de espera, embarquei rumo ao Terminal Padre Pelágio.

Cheguei ao Terminal e após um alongamento dirigido pelos acadêmicos de Educação Física, partimos pra nossa ensolarada caminhada. Estavam presentes estudantes, professores e técnicos administrativos de várias unidades da UEG e várias cidades: Goiânia, Anápolis, Porangatu, Cidade de Goiás, etc. Há 22 dias de greve, reivindicamos, basicamente, investimentos do estado na Educação Superior, especificadamente 5% do PIB de Goiás pra área.


Por meio do carro de som, gritos e panfletos, lembramos à população da região noroeste de Goiânia (setor onde está o Termina Padre Pelágio) que o governador Marconi Perillo prometeu a criação de uma unidade da UEG na região. Mas desde que foi criada, em 1999, a UEG e suas unidades vêm crescendo em quantidade, mas não recebem recursos suficientes, o que prejudica suas qualidades. Na unidade em que estudo, em Anápolis, o prédio está em risco de desabamento. Na outra unidade de Anápolis, falta mais água tratada do que em um campo de refugiados palestinos. Sem contar na geral falta de professores em alguns cursos, de materiais de limpeza, etc. Logo, a criação de mais unidades enquanto outras se prejudicam, é uma criação irresponsável.



Parte da população vê os manifestantes como marginais e desocupados. Isso deve vir do medo e vergonha do brasileiro de ir à rua exercer um direito seu, que é o de protestar. O brasileiro, em seu tolo orgulho, espera alguém fazer algo por ele ou simplesmente espera por Deus. Outra parte da população nos apóia e no caso dessa caminhada, até aplaudiu. A situação chegou a um ponto em que as ações do governo e de suas empresas parceiras afetam a todos os estudantes e trabalhadores da classe média pra baixo, como no caso do aumento da passagem do transporte coletivo.

Durante a caminhada, distribuí panfletos e foi engraçado ver as reações de algumas pessoas ao receber os papéis informativos. A maioria os recebe de bom grado, se os lê, não sei. Uma minoria não recebe. Uma senhora cruzou os braços pra mim e se afastou com cara de nojo. Outro disse: “Não, quero mexer com isso não!”. Quem vê assim, até pensa que o chamei pra liderar a greve...

No momento da passeata ouvimos que houve conflito entre a polícia e os manifestantes contra o aumento da tarifa dos ônibus no Terminal Praça A, que estava no caminho de nossa passeata. Os manifestantes na Praça A tocaram fogo em pneus e bloquearam o acesso ao terminal, logo, a polícia militar e mais tarde, o Batalhão de Choque e as chamadas “bombas de efeito moral”, apareceram, aumentando a violência da área. Segundo o comandante da operação, a polícia tentava manter a segurança do patrimônio público. Contudo, a polícia cuspiu violência pra quem estava no local, estando relacionado ou não com a manifestação, seja humanos vindo da Cidade de Gondor ou hobbits vindo do Condado. Um garoto que esperava um ônibus levou cacetadas e uma garota teve seu celular quebrado. O caso levou até a procedimentos administrativos na PM, mas fiquei sabendo isso apenas à noite pelo telejornal.

Assistindo ao jornal me assustei ao ver um policial socando um amigo da Filosofia no rosto simplesmente quando o estudante foi falar com ele. Não é preciso informar seu nome, mas acho que naquele momento, todo estudante ou jovem se sentiu representado e se sensibilizou ao ver o manifestante sendo esbofeteado. O estudante me informou que apenas pediu a bandeira ao policial e foi agredido. Vejam abaixo a foto e o vídeo dessa manifestação.



A reação da polícia foi ambígua. Na nossa passeata, a polícia militar e os guardas de trânsito contribuíram para a passividade e para o andamento do protesto, chegando até a reprimir motoristas malandros que tentaram furar o nosso bloqueio nas ruas. Procuravam manter a ordem, mas a busca insana por essa ordem foi lamentável no outro protesto.

Sabendo da situação na Praça A, contornamos o local do conflito. Minutos depois, alguns remanescentes da outra manifestação se juntaram a nós. Alguns punks, anarquistas pós-modernos ou algo do tipo estavam com o rosto vendado e segurando cabos de vassoura. Vi de perto um policial reprimir verbalmente quatro sujeitos com os cabos. Na hora, pensei: “Vixi, Maria, é agora, Diabo!”, mas foi mais minha tensão exageradamente insana (ou não).


Fiquei na manifestação até o início da ocupação na Praça Cívica, em frente ao palácio Pedro Ludovico Teixeira, como visto na foto acima. Na ocasião, pedia-se a presença do governador perante a Comissão de Greve. Uma possibilidade até longínqua, pois é melhor dar as caras em propagandas eleitorais.

P. S: No fim do dia, encontrei esse post na página do Facebook UEG DENÚNCIA:

UEG marca presença na Assembleia Legislativa de Goiânia, onde pede posicionamento quanto ao movimento estudantil. Deputados votam e é aprovado que o Marconi deva receber a comissão de negociação da UEG!! Nossa LUTA está cada vez mais forte!!
Vem pra LUTA você também!!!


Mais informações:


quarta-feira, 29 de maio de 2013

Crônica: Aprendiz de Escritor

Aprendiz de Escritor
Por Thiago Damasceno

            Saudações, camaradas da astronave Terra!
           
            Andei sumido por uns dias, mas por uma boa causa: escrevo e reescrevo uns contos que invento desde o ano passado. Alguns vou enviar pra concursos literários e outros, publicar aqui. Focado nessa tarefa, confesso que estava sem ideias pro blog, então lembrei que posso muito bem falar do que venho aprendendo no campo da escrita de ficção.


             Destaco um conselho prático do apocalíptico Eduardo Spohr, autor de A Batalha do Apocalipse, que afirma que não há inspiração, que inspiração é mito. Pra criar é preciso (também) cercar-se de referências. Vi que é assim mesmo. Me considerava sem inspiração, então passei a ler muitas obras de terror, horror, literatura fantástica (a linha que venho produzindo) e filmes e séries do gênero. Mergulhei com tudo no mundo da bizarrice, ganhando com isso alguns pesadelos. Porém, as ideias estão brotando na minha pobre e jovem mente conturbada até agora. É uma questão de vontade, criatividade, preparo, organização e tempo. Escrever requer tempo, muito tempo...

            Somos antenas parabólicas, vivemos captando coisas e armazenando-as seja no nível consciente ou inconsciente. Devidamente ambientado e após criar, ler outras obras e algumas coisas de Teoria Literária e técnicas de escrita... comecei a escrever!

Imagino a estória, seus cenários e personagens como se fizessem parte de um filme, um filme interior. Viro uma espécie de “câmera da imaginação” e como ser real, ser com corpo presente, registro pelas palavras o que fantasiei.

            Esses são alguns pensamentos de um aprendiz de escritor. À medida que eu for produzindo mais ficção, também produzirei mais crônicas sobre essa estética experiência. Até a próxima e que a imaginação nos leve aonde nenhum homem jamais esteve.

quarta-feira, 8 de maio de 2013

Crônica Social: Pelas Ruas Que Andei I

Pelas Ruas Que Andei
Crônicas Sociais

I

Contra o Aumento da Passagem do Transporte Coletivo

Por Thiago Damasceno

            Acordei levando um tapa na cara do Sol goianiense que entrava pela janela de vidro do quarto. Pensei que seria mais um belo dia de Sol com céu azul a la Maranhão, mas nem tanto. Não bastava o descaso do governo estadual e a consequente greve da Universidade Estadual de Goiás (UEG), onde estudo, outra indignação social daria as caras. Após forrar o estômago com um delicioso cuscuz de arroz, fui ler uma matéria sobre o gênio do terror Edgar Allan Poe. Porém, o terror começou mesmo quando ouvi uma gritaria na rua. Abri a janela e me impressionei ainda mais ao ver os ônibus do Eixo (Metro Bus) circulando pela Rua 04. Isso só acontecesse em comemorações pela Independência ou aniversário da cidade, mas não, havia (há) um movimento na rua.

            Com toda a classe média que compõe minha índole, desci do prédio e fui ver o que se passava no sempre barulhento centro de Goiânia. Havia algumas dezenas de manifestantes no cruzamento da Avenida Goiás com a Avenida Anhanguera, paralisando parte do trânsito da capital. Eles reivindicavam (e reivindicam) a paralisação do preço da passagem do transporte coletivo da cidade, que pode subir de R$ 2,70 pra R$ 3,20! Isso sim é terror! Se Poe estivesse vivo, talvez escrevesse um poema ou um conto sobre isso. Pagar R$ 3,20 pra andar em ônibus atrasado, sujo e lotado é piada de mal gosto! O governo, atrelado às grandes empresas privadas responsáveis pelo setor de transportes, deixa estudantes e trabalhadores a desejar, mais uma vez...

Havia muitas viaturas e policiais armados no local da manifestação e um estudante foi preso, mas recebeu apoio jurídico. O corpo de bombeiros também foi chamado porque os manifestantes fizeram uma fogueira, mas nada que fosse preciso chamar os Vingadores pra ajudar a pagar um impossível incêndio. Os manifestantes pediam a presença de representantes do CMTC (Companhia Municipal de Transporte Coletivo) para a entrega de um documento ao presidente (a) do órgão, que até onde fiquei sabendo, estava indo para o local.  Deixaram claro que outras manifestações seriam feitas com o mesmo objetivo. Todo brasileiro sabe que isso deve ser feito devido à maldita burocracia dos poderes públicos.

            A cidade e o estado andam agitados nesses dias: greve na UEG desde algumas semanas, greve dos motoristas de ônibus na semana passada e agora, movimentos contra o aumento da passagem. Isso é o que sei. Pelas outras cidades há mais coisas que nem sempre a mídia mostra. Abaixo, fotos da manifestação de hoje (que ainda acontece enquanto escrevo este texto) e parte do texto do panfleto assinado pela Frente Contra o Aumento distribuído pelos manifestantes. Continuarei escrevendo essas crônicas sociais à medida que eu participar e ver mais movimentos. Já deveria ter começado a escrever bem antes, bem antes...



Eixões parados e vazios

Já dizia a canção: "Você precisa de alguém que te dê segurança, senão você dança..."
Frente Contra o Aumento

CONTRA O AUMENTO DA PASSAGEM
CONTRA O GOVERNO DAS EMPRESAS
R$ 2,70 JÁ É ROUBO, R$ 3,20 ENTÃO?!

            Este ano as empresas do transporte seus parceiros “públicos” anunciaram outro aumento da passagem de ônibus. A ideia é que a tarifa aumente pra no mínimo R$ 3,20!

            Esse aumento, como todos os aumentos que tivemos nos últimos anos, não se justifica para os usuários do transporte coletivo. Os atrasos e os ônibus superlotados continuam! É mais um aumento para saciar a sede de lucros das empresas que compõem a Rede Metropolitana de Transporte Coletivo: Metrobus, HP, Rápido Araguaia e Cootego.

            Em 2007, a passagem de ônibus era R$ 1,80. Em 2012 já chegou a R$ 2,70.

            É um aumento de 50% em apenas 5 anos! Mesmo a inflação aumentou apenas 35% de 2007 pra cá... Será que houve tantos custos extraordinários que justifiquem?

            Quais são os custos? Por que a CMTC não publica os cálculos feitos para justificar o aumento? Com que compromissos os Secretários do Governo do Estado e Prefeitura, além dos próprios prefeitos de Goiânia, Aparecida e Senador Canedo sempre votam a favor do aumento na Câmara Deliberativa do Transporte Coletivo (CDTC)?

Por que os usuários não têm voz nessa questão que afeta diretamente o nosso bolso, nossas vidas?
           

sábado, 27 de abril de 2013

Crônica: CIDADE GRANDE, Cidade Pequena II

NOTA: A Universidade Estadual de Goiás (UEG) está em GREVE. A situação é crítica: prédios em risco de desabamento, falta de água tratada em alguns campus, ausência de restaurantes universitários (R.U.s), necessidade de mais concursos para professores, mais bolsas de estudos para os alunos, etc, etc.
Cadê o governo estadual que prometeu desenvolver a Educação do estado?
Cadê a UEG exibida na propaganda eleitoral do PSDB?
Por quê diabos esse mesmo governo dá dinheiro a UFG enquanto a Universidade Estadual se complica cada vez mais?

PENSE BEM ANTES DE VOTAR

Para mais informações: http://www.movimentomobilizaueg.blogspot.com.br/


Mais uma crônica escrita há tempos e revisada em mais um dia desses...

CIDADE GRANDE, Cidade Pequena

II

Por Thiago Damasceno

        Na quinta-feira (14/04/11) encontrei um velho amigo de Carolina e ficamos zanzando pela cidade atrás de umas coisas. À noite, eu, ele e sua irmã fomos pro McDonald´s tirar os estômagos da miséria alimentar. Refletimos que em Carolina, assim como em qualquer cidade pequena, poderíamos ficar sentados nas mesas dos barzinhos por muito tempo sem se preocupar em voltar pra casa. Naquele dia estávamos preocupados com o horário do último ônibus e com a violência nas ruas, como sempre. Se tivéssemos carro ainda estaríamos preocupados com a violência. Sempre haverá mais preocupações nas cidades grandes do que nas pequenas. Nas cidades grandes se vive mais em relação a um sistema, traímos mais as nossas horas e a nós mesmos com as coisas que nós mesmos criamos (enquanto sociedade) e quando damos fé, estamos vivendo feito robôs, preocupados com a possível falha de uma engrenagem qualquer. Vivemos numa paranoia de tempo.

        Voltei pra casa de ônibus e peguei-o do lado errado. Não é novidade. Sempre acontece comigo quando vou pegar ônibus. Perguntei pra um homem de meia idade que estava sentado atrás de mim sobre como poderia voltar para o Centro. Ele respondeu e eu ri de mim mesmo. Fiquei pensando e minutos depois perguntei pra ele se eu poderia parar e voltar na avenida pelo qual o ônibus passava no momento. Ele disse que eu economizaria mais descendo adiante, em um terminal chamado Cruzeiro e concluiu irritado: “Quer gastar dinheiro à toa rapaz?” Fiquei calado. Na verdade eu queria dar 1 milhão de reais pra chegar mais rápido em casa e matar minha sede, embora eu não estivesse com “a sede, a sede de beber a vida em infinitas viagens”, como escreveu o poeta goiano Afonso Félix de Souza.


        Chegando ao Terminal do Cruzeiro, um terminal respeitável, reformado e decente com seu banheiro novo e aquela coisa boa chamada limpeza, uma senhora que estava no mesmo ônibus que eu e viu a dúvida passando furtivamente pelos meus olhos me guiou até o ponto onde eu poderia pegar um ônibus pra minha Terra Prometida. Ela aparentava ter entre 55 e 60 anos. Retribuí sua gentileza carregando sua sacola de compras. Quando entrei no ônibus ela acenou pra mim e disse um “Vá com Deus!”. Amém.

        Segundos após ter sentado, uma mulher entre os 45 e 50 anos sentou do meu lado e foi contando que estava cansada. Perguntei se ela estava trabalhando e a conversa rolou. Ela estudava num programa chamado EJA (Educação de Jovens & Adultos), pois abandonou os estudos quando engravidou aos 17 anos. Ela falou que estava arrependida de ter largado os estudos e cansada da vida de dona de casa, então voltou a pôr a cara nos livros. E ela disse que também falou isso pra uma amiga sua, questionando: “Cê tá satisfeita em ser dona de casa, em fazer comida pro seu marido o tempo todo?”. Fantástico! Muitas pessoas divertidas estão escondidas no anonimato do dia a dia. Ela desceu antes de mim e a conversa se encerrou. Foi um bom papo. Gosto de ouvir histórias, mas chega a ser bizarro e engraçado o fato de uma pessoa contar parte de sua vida pra um desconhecido simplesmente porque precisa de alguém pra desabafar. Ela me contou mais coisas do que relatei neste parágrafo.

        Cheguei em casa ainda vivo. O retorno nem foi tão perigoso assim, mas o perigo persegue a todos a toda hora. Fiquei pensando no homem que se irritou com minhas perguntas, na senhora solidária e na mulher que voltou a estudar. Fiquei pensando nesses vários personagens que o cotidiano nos apresenta meio que por acaso.

sábado, 20 de abril de 2013

Crônica: CIDADE GRANDE, Cidade Pequena I

Crônica escrita em meados de 2011 e revisada um dia desses.

CIDADE GRANDE, Cidade Pequena
I

Por Thiago Damasceno

        Sempre digo pros meus amigos: “Goiânia é uma pequena cidade grande”. Digo isso porque em qualquer lugar que você vai, em qualquer setor, em qualquer dia, você encontra um conhecido nesta cidade, mesmo que você não tenha a oportunidade de falar com ele e só veja seu rosto familiar desaparecendo lentamente na multidão. A cidade é grande, mas parece uma cidade do interior.

        Me comprovei esse fenômeno, já mencionado por sociólogos, no decorrer dos cinco anos que moro aqui. Esse fato é interessante porque a maioria das pessoas que migra do interior pra uma capital ou outra cidade grande (incluindo eu) entende, num primeiro momento, a cidade grande como um aglomerado de cidadãos, prédios, ruas, carros, crimes e outros elementos onde as pessoas não se conhecem bem e quase nunca encontram alguém conhecido (e também entendem tais cidades como primeiros alvos de possíveis invasões alienígenas). Tais ideias não são totalmente verdadeiras, mas as capitais são notáveis aglomerados impacientes. Entretanto, em Goiânia os encontros sempre acontecem. Até peguei a mania de contar quantos conhecidos eu encontro num passeio pela cidade. Mas vale lembrar que Goiânia, e nem toda capital brasileira, é uma São Paulo ou New York da vida, cidades das quais só ouço rumores. Nunca as vi fora da TV, nunca farejei seus ares ou andei por suas ruas.


        Conversando com uma amiga, eu falei minha primeira citação do texto e acrescentei: “O cúmulo dos encontros em Goiânia é você encontrar a si mesmo”. Disse após ter encontrado dois conterrâneos sem mais nem menos. Como seria, numa situação imaginária, encontrar a si mesmo? Você está andando e de repente se vê, mas não percebe imediatamente que é você, apenas sente algo familiar no indivíduo à sua frente. Nisso você estende a mão, ele retribui o gesto e você pergunta:

- Já te vi antes, né?

-Acho que sim. A gente deve ter sido em algum showzinho, festival...

- É mesmo... Mas e aí, como vai? Qual o teu nome?

-Algo me diz que você deve saber a resposta...

        Enfim, esse encontro de “eus” geraria uma conversa muito longa, interessante e curiosa (ou então o aniquilamento de ambos, conforme certas correntes da Física). Essa situação hipotética me lembra uma canção do Pink Floyd em que um trecho da letra diz: “Duas pessoas que andam na rua, dois olhares que se cruzam, de repente eu sou você e quem eu vejo sou eu”. E isso também me lembra a possibilidade de conversar consigo mesmo que uma cidade grande oferece. Afinal de contas, quantos pensamentos já não passaram por nossas cabeças voltando pra casa em algum ônibus lotado das 18 horas? Quantos projetos de vida já fizemos e desfizemos esperando o ônibus chegar no ponto em que o esperávamos? Quantas vezes, distraídos com as ideias, quase fomos atropelados andando pelas ruas?

            Nossas mentes seguem o ritmo das cidades e nossos corpos também.
      

sábado, 6 de abril de 2013

Crônica: “A Vida é Uma Longa Canção”

Crônica escrita em 06/04/12, na ressaca da gravação do álbum Cantos Urbanos, e revisada hoje, um ano depois.

“A Vida é Uma Longa Canção”

Por Thiago Damasceno

            É noite de sexta-feira. Choveu e está fazendo frio, mas a chuva já parou. Venho ao meu quarto, ligo o computador e tento estudar. Lembro que preciso fazer um layout novo pro blog. Uso uma foto que Heitor tirou em Carolina durante um dos dias de gravação de “Velho Silêncio”. Coloco ao lado da foto umas frases do Bob Dylan, que interpreto como um momento de autoconhecimento. Um momento que estou passando “jamais visto em toda a história” da minha vida. Lembrou do Lula? “Conhece-te a ti mesmo”. Já dizia a inscrição do Templo de Delfos, na Grécia Antiga. Dizem que Sócrates também defendia esse princípio.

            Lembro também que é preciso organizar o material pro blog “Viajante Clandestino”, onde eu e Heitor divulgaremos nossas músicas. Pego um DVD onde gravei todos os clipes que fizemos e assisto a todos. A saudade bate no peito. Mando um SMS pra Heitor dizendo: “A saudade dói, bixo”. Mais uma vez afirmo que as férias foram alucinantes. Pra saber mais, leia as crônicas “Seguindo Viagem”. Acho que nem as pessoas que estavam mais próximas da dupla dinâmica poderiam sentir o que sinto. Acho que só ele sente. De qualquer modo, não quero bater mais uma vez na mesma tecla. O momento foi único. É aí que começa a questão.

            Encosto meu rosto na grade gelada da janela do quarto, ainda sentado na mesma cadeira onde sento para ficar de frente ao PC, pois a janela fica ao lado do computador. As luzes da cidade estão acesas, uma ambulância passa gritando, a drogaria em frente começa a ser fechada, poucos carros passam pela rua, uns mendigos andam de lá pra cá. A cidade começa a dormir e enquanto o tempo passa as lembranças martelam na minha cabeça. Parece que aqueles meses rodeados por parentes, amigos e música envolveram outra pessoa que não era eu. Estranho como você olha pro seu passado e não se vê muito bem. Será que a mudança de uma pessoa, que ocorre entre o passado e o presente, é tão profunda assim a ponto da pessoa estranhar a si mesma?

            O budismo ensina a tentar não sofrer com o que aconteceu e com o que pode acontecer. Ensina a manter a mente serena e a se colocar no momento, evitando o apego, que seria, basicamente, a criação de expectativas irreais em cima de objetos, pessoas e momentos. Mas o próprio budismo admite que criamos expectativas. É da natureza humana. A prática meditativa nos ensina as lições difíceis e milenares pra não cair no apego. É muito difícil andar no chamado “Caminho do Meio”. É difícil lidar com a passagem do tempo. É difícil controlar a mente.


Estou me expondo muito? Talvez. Ou talvez eu só deva sentar no escuro do quarto e pensar sobre mim e minhas relações com as pessoas, objetos e fatos da minha existência, como fiz ontem. Talvez por isso eu tenha acordado hoje mais “pé no chão”. Estou me expondo muito? Talvez. E talvez este blog sirva mesmo pra isso ou eu apenas estou servindo ao meu narcisismo, essa necessidade que muitos têm de se expor. Ou talvez eu só queira que meus leitores me conheçam mais, ou simplesmente desabafar via Internet. Por onde andam os papéis?

Estou falando demais? Talvez. Ou talvez seja a hora de, mais uma vez, buscar refúgio na Arte, tal qual um típico romântico do século XIX. Quem disse que ela não tem suas funções? Talvez seja hora de escrever uns contos e quem sabe, depois, compor algumas músicas.

Ouço agora, após escrever esta crônica, meio que para aceitar a “realidade”, a canção “Life Is Long Song”, da banda escocesa Jethro Tull, que acaba com os seguintes versos:

“A vida é uma longa canção,
mas a música termina cedo demais para todos nós”.
(Ian Anderson)





domingo, 31 de março de 2013

Crônica: Ouvidos Caninos

Crônica escrita em 13/11/11 e revisada um dia desses...

Ouvidos Caninos

Por Thiago Damasceno

            Sabe aqueles dias em que você acorda com ouvidos de cachorro? Não?! Eu sei. Hoje acordei assim, ouvindo intensamente, com a percepção auditiva muito aguçada. Ou então foram os sons do mundo inteiro que resolveram me danar.

            Foi difícil prestar atenção à excelente aula de Teoria da História cujo conteúdo era a filosofia de Nietzsche. A atenção era desviada porque todas as outras salas do corredor estavam barulhentas. Conversas, gritos, risos e professores proclamando seus conteúdos. Pra aumentar ainda mais o barulho, os carros que passavam na rua do lado ou estavam fazendo racha em plena luz da manhã ou estavam usando os primeiros motores fabricados pra navios, porque o som deles era ensurdecedor. Parecia que a parede da sala tinha virado rua. Pude ouvir profundamente os roncos raivosos e apressados daquelas máquinas de poluição atmosférica e sonora.

            Voltando de ônibus pra casa, dei continuidade à minha leitura de Drácula. Ainda bem que a estória do livro é excelente, senão o agonizante motor do ônibus não teria me deixado ler direito. Mas antes de ir pra casa, fui pra biblioteca renovar o aluguel do livro mencionado. Pra minha surpresa o estabelecimento estava fechado. Natural, natural. A Lei de Murphy se manifestou: o dia começou angustiante e iria continuar assim. Desiludido quanto à renovação do livro, voltei pra casa a pé. O barulho da rua estava infernal. O movimento era o de sempre: pessoas apressadas, carros, ônibus e motos quase à velocidade da luz, discos voadores, ataques de zumbis, enfim, aquela bagunça que é o centro de uma capital ao meio-dia. Acontece que o que me incomodava não era o movimento, mas o barulho. Tinha se intensificado ou era eu sofrendo uma mutação auricular. Mas o fato é que meus ouvidos estavam doendo!

            Cheguei em casa cansado de tanto correr da balburdia urbana. Enfim, o sossego. Quer dizer, seria o sossego, caso o vizinho do apartamento de cima não estivesse reformando seu lar. O barulho das batidas de martelo era de matar, mas pior seria se fosse um final de semana em que eu chegasse em casa cansado e esse mesmo vizinho estivesse fazendo churrasco, bebendo cerveja e ouvindo pagode.
           
            Sem ofensas aos finais de semana, churrasco e à cerveja.