ThiagoDamasceno: Crônicas das Férias: O Crepúsculo de Julho

domingo, 12 de agosto de 2012

Crônicas das Férias: O Crepúsculo de Julho


O Crepúsculo de Julho

Por Thiago Damasceno

de Carolina-MA
            

         Se eu citar a budista frase de Jack Kerouac “A beleza das coisas deve estar no fato de terminarem” vou me repetir, mas é isso mesmo. Acabou-se a “turnê” da banda Blackout, acabou-se a euforia, tem gente indo embora, acabou-se o movimento noturno, acabaram-se as festas. Acabou-se: É o começo de tudo. O começo de coisas novas, ou melhor, de velhas coisas novas. Talvez tudo aconteça de novo.

de Goiânia-GO
            
         No sábado, dia 28, após voltar da nossa apresentação musical no festejo de Filadélfia-TO, fui à casa de uma amiga. Descobri que ela iria embora no dia seguinte. Foi então que caiu a minha ficha. No decorrer dos dias, mais pessoas estavam indo embora e a euforia que era tão presente, lentamente se dissipava, deixando os mesmos rostos de volta à cidade, deixando as mesmas ruas com a lentidão habitual. Enfim, o marasmo pouco a pouco impregnava na pele. As possibilidades, antes numerosas, ficaram reduzidas.

       Ainda bem que o grupo de amigos mais próximos permaneceu e assim, pudemos inventar algumas aventuras na noite/madrugada, como gravar algumas músicas do Viajante Clandestino, tocar violão, sair pra comer, conversar no píer da beira rio, andar por escuros e perigosos matagais só pra cortar caminho, etc.
            
         A ida de um velho amigo que já não era mais o mesmo já havia sido superada. Uma garota que eu não havia visto direito e foi embora, voltou e pudemos nos ver de novo. Uma festa na Itapoã não vingou. Acabou cedo e com poucas pessoas. Ao menos nossa garrafa de vodka rendeu histórias pra contar, incluindo uma pequena aventura no subúrbio da cidade, rumo a uma “festa” na casa de um cara semidesconhecido, que também não rendeu nada. Luciano, Orleans e eu nos embrenhamos por ruas e ruelas até então desconhecidas por mim, que achava que conhecia minha cidade como as letras das minhas canções. A zona era escura e perigosa e havia apenas uns 10 gatos pingados no local da “festa”, incluindo alguns corpos femininos desinibidos.

         As aventuras amorosas que aconteceram no fim do mês não foram tão emocionantes e calientes como os famosos “romances de verão”. É... Havia alguma coisa no ar, mas não era mais a excitação julhística.
            
        No meio dessa calmaria, quando voltava pra casa de madrugada, lembro de parar no meio das ruas solitárias e olhar pra Lua minguante. Eu levei meu telescópio pra cidade e comecei a observar a Lua na sua fase crescente. Nem percebi quando ela entrou pra fase cheia de tanta coisa que eu fazia. No silêncio da madrugada percebi ela nascendo minguante, sinalizando que as coisas estavam diminuindo, chegando ao fim. 




         Lua, Sol, rio, ar de verão... Passei a ouvir mais Lulu Santos, inclusive músicas “praieiras” como Sereia, De Repente Califórnia e Como Uma Onda No Mar (Zen Surfismo). Esta última, musicada por Lulu e com letra de Nelson Motta, se assemelha às ideias do conceito de eterno retorno nietzschiano que expus um pouco no texto anterior.

“Nada do que foi será de novo do jeito que já foi um dia
Tudo passa, tudo sempre passará
A vida vem em ondas como um mar
num indo e vindo infinito

Tudo que se vê não é igual ao que a gente viu a um segundo
tudo muda o tempo todo no mundo
Não adianta fugir nem mentir pra si mesmo, agora
há tanta vida lá fora, aqui dentro, sempre
como uma onda no mar, como uma onda no mar...”

         Essa letra clara diz tudo. A existência é uma onda que vai sempre trazer de voltas emoções que sentimos antes e agora. Deixei a cidade onde mais me sinto em casa pela vida que pulsa aqui, uma vida que pensei que esqueci enquanto vivi outra rotina. Goiânia traz novidades, trânsito intenso, barulho, pessoas apressadas, comprometidas e comprometedoras, estudos, leituras, discussões, faculdade, solidões, cansaços, risos, sertanejos universitários, roqueiros cabeludos, cultura caipira, cultura urbana, autoconhecimento, passado, presente e futuro.
            
           No entanto, tudo isso não foi o suficiente pra reter minhas lágrimas enquanto o ônibus em que eu estava deixava Carolina. Não consegui segurar o choro quando deixava a cidade atravessando o rio Tocantins e ouvindo “Tudo Outra Vez” de Belchior e Fagner;

“Há tempo muito tempo que eu estou longe de casa
E nestas ilhas cheias de distância
o meu blusão de couro se estragou...

E vou viver as coisas novas que também são boas
O amor, o humor nas praças cheias de pessoas
Agora eu quero tudo, tudo outra vez...”




            Quero outra vez Carolina com suas praças cheias de pessoas, seus dias e noites cheias de possibilidades. Como diz o poeta goiano Afonso Felix de Sousa, quero “a sede, a sede de beber a vida em infinitas viagens... A impaciência de que chegue a manhã e a praia, a tarde e o amor”. Mas foi com essa sede que me senti atraído na manhã da quinta-feira passada quando vi, do ônibus, os prédios de Goiânia ao longe, enfeitando o horizonte. Mesmo triste, fui atraído por essa urbanidade caipiresca.
            
               Que venham as outras férias! Enquanto isso, vou bebendo a vida em infinitas viagens e, longe do cenário e dos personagens que atuaram em julho, agora eu quero tudo, tudo outra vez. 



Fotos: Vilmar Lima Rego





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