Anhanguera
(Thiago Damasceno)
Não queremos
sua água de fogo
ela não mata
nossa sede
Não queremos
sua foice
ela não abre
nossos caminhos
Não queremos
sua bateia
ela não
peneira nossas riquezas
Não queremos
seu bacamarte
de nada ele nos
protege
Não queremos
sua astúcia enganadora
e nem sua
coragem assassina
Não queremos
suas glórias
e nem os
louros das suas vitórias
Seu triunfo camufla
nossas dores,
mas não
queremos o seu esquecimento,
pois nossos
mortos merecem ser lembrados
para que renasçam
sempre que cada lufada de vento solar
soprar pelo
cerrado que resiste sob o céu cinzento
e abençoa todos os marginais sedentos por justiça
e se estende dias e noites Brasil adentro
pelas
chapadas onde verdejarão
os nossos
destinos
Não queremos
velhos diabos
nem deuses
genocidas
Queremos a
queda da sua figura
a derrubada
da sua homenagem
os farrapos
da sua honra
e a falência
da sua linhagem
Semearemos na
terra e no asfalto
as histórias
que nos dizem respeito
Nascerão
árvores majestosas
com sementes
a que temos direito
Louvaremos
nossos quilombos e aldeias
faremos monumentos
em tributo
às forças
ancestrais que nos rodeiam
De uma vez
por todas é a nossa vez!
Nossa voz
mata a nossa sede
Nossos
braços abrem nossos caminhos
Nossa força ergue
nossas riquezas
Nossa
coragem nos protege
Nossa
astúcia nos mantêm vivos
Cravaremos
na garganta do medo
todas as
nossas vitórias
Seremos as
cores, as folhas e as palavras
dos futuros
livros de história
Para nós,
motumbá!
Para você,
nenhum axé!
Para o novo
amanhã, saravá!
Foto: Letícia Coqueiro
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No dia 31/03/22 participei do debate de lançamento do curta-metragem “NenhumGenocida de Pé” na Casa de Vidro. Esse curta registrou a performance artística de protesto de grupos feministas, em 04/12/21, no monumento ao bandeirante, localizado no centro de Goiânia.
O monumento é uma estátua de Bartolomeu Bueno da Silva Filho. Ele e seu pai ficaram conhecidos como “Anhanguera” 1º e 2º, termo que significa “Diabo Velho” em tupi. Reza a lenda que essa alcunha foi dada pelos indígenas ao Anhanguera 1º após ele atear fogo numa tigela com aguardente para impressioná-los, ameaçando pôr fogo nos rios e fontes caso eles não informassem onde havia ouro. Esses 2 bandeirantes paulistas realizaram suas bandeiras (expedições) em Goiás do final do século XVII ao início do XVIII. Essas expedições tinham como objetivos a exploração do território, a captura de indígenas para escravização e a destruição de aldeias e quilombos.
A estátua do Anhanguera 2º tem uma postura imponente. Ele segura uma bateia – tigela usada nos garimpos – e um bacamarte – uma antiga arma de fogo. Esse monumento foi feito pelo artista plástico Armando Zago a pedido do Centro Acadêmico XI de Agosto da Faculdade de Direito de São Paulo, que o deu aos goianienses em 09/11/1942, poucos meses depois do Batismo Cultural de Goiânia. Desde então o local foi palco de movimentos políticos como as Diretas Já, os Caras-pintadas, etc. O monumento também foi alvo de pichações em protestos à valorização da história dos bandeirantes, repleta de violências.
Escrevi esses versos tendo em mente essa postura crítica à história regional e nacional, mencionando também elementos da cultura afro-brasileira. Estilisticamente também pensei na prosa poética de Jack Kerouac, da Geração Beat, caracterizada por enunciados longos, muitos conectivos e pela exaltação dos marginalizados.
REFERÊNCIAS
FERNANDES,
Fernando R. Bandeirantes. “Infoescola”, 2022.
Disponível
em: https://www.infoescola.com/historia-do-brasil/bandeirantes/
PESSONI,
Carolina. Monumento ao Bandeirante: de bacamarte na mão, o Anhanguera vigia
Goiânia. “A Redação”, 25/06/21.
Disponível
em: https:// www.aredacao.com.br/colunas/152781/monumento-ao-bandeirante-de-bacamarte-na-mao-o-anhanguera-vigia-goiania
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