Um dia desses eu empurrava esta
carcaça chamada corpo pelo centrão de Goiânia quando passei ao lado de um
indivíduo horripilante. Suas roupas eram farrapos! Seu cabelo era um emaranhado
de seboseira! Sua pele era uma crosta escura de sujeira! Ele era um verdadeiro arauto
da Derrocada da Civilização!
Denominei-o de “indivíduo” porque
creio que ele não tem RG, CPF, tampouco Certidão de Nascimento. Talvez ela não
exista para a burocracia do poder público. É um desses desejáveis indesejáveis
do sistema.
É indesejável porque poucos o
toleram por perto, então a maioria finge não vê-lo. Mas ao mesmo tempo, sua
existência miserável é aceita. Em suma, é uma presença que encaramos como
ausência.
E ele é desejável porque nosso
modo de vida produz e precisa desses miseráveis. É fato que o capitalismo
produziu alguns avanços. Mas a que custo? E, principalmente, para quem? Nossa
civilização necessita desses indivíduos horripilantes. Eles convêm. Para haver
o bem-aventurado, é preciso que também exista o mal-aventurado. Para haver os
viventes apressados, é preciso que também existam os defuntos ambulantes.
E chegamos ao ponto (des)civilizacional
de alguns (des)formadores de opinião proclamarem coisas como “Tá com pena? Leva
pra casa!”.
São coisas tristes de se ouvir.
E todo maldito dia encontramos
mais e mais arautos da Derrocada da Civilização.
O BICHO
(Manuel Bandeira)
Na imundície do pátio
Catando comida entre os detritos.
Quando achava alguma coisa,
Não examinava nem cheirava:
Engolia com voracidade.
O bicho não era um cão,
Não era um gato,
Não era um rato.
O bicho, meu Deus, era um homem.
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