A versão do cineasta Zack Snyder do filme “Liga da Justiça”, que será lançada no próximo dia 18, é um dos assuntos mais comentados na cultura pop ao lado de séries como “Wanda Vision” e “Falcão e o Soldado Invernal”. Como nerd de carteirinha, estou acompanhando a discussão e rindo muito de ideias e discursos exagerados provocados pelo hype com o filme
A primeira dessas ideias que vou
abordar é um comentário comum nos posts sobre essa versão da Liga: “Snyder é o
melhor diretor de todos os tempos!”.
Calma lá, jovem!...
Se Snyder é o melhor diretor de todos os tempos, que adjetivos utilizaremos para nomes como Kubrick, Scorsese, Coppola, Godard, Glauber Rocha, dentre outros consagrados? Não que Snyder seja um diretor ruim. Gosto de trabalhos dele como “Madrugada dos Mortos” (2004), “300” (2006), “Watchmen” (2009) e “Homem de Aço” (2013), mas igualar sua carreira de filmes de super-heróis e outros personagens badalados da cultura pop com filmografias mais sérias e profundas de diretores respeitadíssimos é de um descabimento risível.
Não que filmes de super-heróis não possam ser mais sérios e com uma abordagem adulta com temas socialmente relevantes para se pensar. Trabalhos como “Batman: ao Cavaleiro das Trevas” (2008), “Watchmen” (2009), “Capitão América 2: O Soldado Invernal” (2014) e “Logan” (2017) provam isso, mas obras nesse estilo ainda não são maioria no gênero cinematográfico dos super-heróis. A maior parte desses filmes segue a fórmula comercial blockbuster sem muitas pretensões artísticas autorais.
Outro discurso igualmente risível é: “ “Liga da Justiça: Snyder Cut” será o maior filme de todos os tempos!”.
Calma lá, jovem 2: o retorno...
Acho a feitura desse filme uma vitória
para Zack Snyder e para nós, fãs do gênero. A demissão de Snyder pela Warner
Bros durante as filmagens de “Liga da Justiça” devido a problemas familiares do
diretor (a morte da sua filha) foi uma tremenda barbaridade. Como se sabe,
entregaram o projeto a Joss Whedon, diretor dos dois primeiros filmes dos
Vingadores. O resultado foi um “Liga da Justiça” (2017) sem sal e todo remendado,
nada jus ao carisma dos maiores heróis do universo DC Comics. Contudo, dizer
que o Snyder Cut será o maior filme de todos os tempos é uma avaliação final
precipitada.
Sem contar que, pelo andar da
carruagem, a tendência é que esse filme seja no máximo mediano tal qual o até
hoje comentadíssimo “Batman vs Superman: A Origem da Justiça” (2016). Nessa
obra, considero que Snyder errou feio. Colocou tantos plots das HQs sem se
preocupar com o desenvolvimento de coisas básicas que o filme se tornou um
amontoado de referências forçando apelos épicos a cada meia hora. Em vez de
tentar desenvolver mais o Superman ou o Batman, Snyder tentou, em um único
filme, apresentar Batman, Lex Luthor e Mulher Maravilha e, de cara, também
colocou o vilão Apocalipse e a morte do Superman. Usou conteúdo demais em um
único filme, sem contar o Batman questionável dele, cujo problema não é nem
estar cansado, violento e amargurado com sua trajetória, mas sim em não
investigar as coisas a fundo, já que o personagem é, em essência, um detetive.
Assim, vimos um Batman que não entende
o Superman como uma personalidade benéfica para o mundo (considera apenas o kryptoniano
inexperiente visto em “O Homem de Aço”) e, pior ainda, vemos um super-herói
conhecido pela sua inteligência e capacidade estratégica tornar-se totalmente
manipulável por Lex Luthor. E esse ainda é colocado no filme como um vilão
megalomaníaco caricato que só faltou dar gargalhas após revelar seu perverso
plano de destruir tudo com um monstro incontrolável como Apocalipse.
Não quero entrar em detalhes
sobre os outros problemas de BvS, apenas alertar que “Liga da Justiça: Snyder
Cut”, é sua continuação direta, correndo o risco de repetir os mesmos problemas
de seu antecessor. Apesar das 4 horas de duração que o filme terá, pelo que já
vimos de trailer e teasers, Snyder deverá fazer muitas coisas nessas quatro
horas como apresentar metade dos membros da Liga da Justiça, três vilões
principais (Lobo da Estepe, Darkseid e o Coringa de Jared Leto), dentre outros
personagens e plots das HQs, como o Superman ressuscitado todo de negro e os grandes
potenciais de Flash, como viajar no tempo. Fora toda a trama em si com
amazonas, atlantes e ameaças intergalácticas de tempos idos!
Há quem diga que ele tentará
fazer em 4 horas (ou nos seus 2 filmes) coisas que a Marvel fez em pouco mais
de 10 anos com vários filmes... Tendo a concordar com esse comentário,
infelizmente.
Chuto que “Liga da Justiça: Snyder
Cut” terá duas linhas temporais principais, uma no presente, com a conquista do
Lobo da Estepe e o Superman Negro como servo de Darkseid, e outra no futuro,
ambientada no universo “Batman Knightmare”. As tramas do filme serão baseadas nas
relações entre essas duas temporalidades e no que os heróis deverão fazer para
evitar o domínio de Darkseid na Terra.
Também veremos flashbacks em
relação à mitologia desse grande vilão e sua tentativa antiquíssima de
conquistar a Terra em uma batalha que envolveu atlantes, amazonas, deuses
antigos e lanternas verdes.
Não me entendam mal: quero que
esse filme seja bom. Quero gostar dele. Já irei assisti-lo querendo isso, mas
com tudo que já expliquei aqui, acho que minhas expectativas não serão
satisfeitas...
Finalizo re-alertando para o
risível proporcionado pelo hype com o filme: achar o Snyder Cut como a última
maravilha do cinema! O hype leva a pensamentos e palavras impensadas,
descabidas, sem um senso de proporção adequado das coisas.
Gosto muito desse universo e
desse gênero cinematográfico, mas, no fim das contas, são filmes sobre heróis
super coloridos que vestem cueca por cima das calças e vilões megalomaníacos
que gritam “Muaháhá!”... Não é a invenção da roda ou a descoberta da penicilina!
Muito menos algo refinado e fenomenal como a trilogia “O Poderoso Chefão” e
outros filmes consagrados da história do cinema.
Em suma, não levemos o universo dos super-heróis tão a sério... Vamos apenas nos divertir e refletir dentro das propostas que eles apresentam.
Thiago Damasceno, 26 de fevereiro
de 2021
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