ThiagoDamasceno: março 2012

sexta-feira, 30 de março de 2012

Crônica: 1 Milhão de Pensamentos

Crônica escrita no dia 18/10/11

1 Milhão De Pensamentos

Por Thiago Damasceno

            Há tempos queria escrever uma crônica que desse uma ideia básica do que se passa na minha mente, cotidianamente, e talvez na mente de muita gente. Os acontecimentos de hoje caíram como uma luva. Ei-los, a partir da tarde.

            Fiquei na universidade onde estudo, a UEG-Anápolis, à tarde, pois queria participar de um minicurso sobre História e Literatura.  O evento apareceu no momento certo, pois ainda estou escrevendo meu primeiro livro de contos, Contos Para Se Ler No Escuro, e procuro aprender sobre qualquer tema relacionado à Literatura. O minicurso foi muito bom e, ao seu término, voltei pra Goiânia de carona com uma professora. Um amigo/colega de curso meu veio junto. No caminho, conversamos sobre filmes, livros, jogos e educação. Fiquei preocupado com os tristes rumos da educação brasileira enquanto olhava o verde do cerrado, com seus característicos formigueiros. A imagem do cerrado, em qualquer época do ano, é pra mim familiar e agradável, talvez porque cresci em um estado onde também há esse tipo de vegetação. Em certo momento, me retirei da conversa pra ver uma mensagem que havia chegado ao meu celular. Era alguém de muito longe dizendo que estava com saudades. Depois disso, dirigi meus pensamentos pra uma garota. Bocejei muito porque estava morrendo de sono. Fiquei acordado até tarde na noite anterior assistindo ao melancólico filme Doce Novembro. Lembrei que preciso escrever sobre ele e postar o texto aqui.

            Nossa professora nos deixou em um ponto de ônibus e entrei em um que ia pro centro da cidade. Meu amigo ficou comigo até ali, pois enquanto eu entrava no ônibus, percebi que ele havia desaparecido igual a um ninja em meio à uma nuvem de fumaça. Não demorou muito pro ônibus encher, aumentando o calor no veículo. Um cara sentou ao meu lado. Como ambos estávamos cansados e éramos estranhos um ao outro, não trocamos nenhuma palavra. Começou a chover. Não foi de repente, pois densas nuvens cinzas que enfeitavam o céu desde o meio-dia anunciavam a vinda da chuva. O calor no ônibus aumentou mais. Usei a força do meu braço esquerdo pra fechar a janela, pois os grossos pingos da chuva entravam violentamente por ela, como ladrões. Lembrei de um dos primeiros hits de Lobão, chamado Me Chama: “Chove lá fora e aqui, tá tanto frio. Me dá vontade de saber! Aonde está você? Me telefona! Me chama, me chama, me chama!”

            Lembrei que o “aonde” está gramaticalmente errado nas frases dessa letra. Mais certo seria usar “onde”, que indica lugar. Depois desse pensamento gramatical, percebi que uma antiga colega de cursinho estava sentada alguns bancos na minha frente. Minha prodigiosa memória fotográfica ajudou-me a lembrar dela e não esqueci seu nome porque ele é o mesmo nome de uma pessoa que marcou minha história há alguns anos. Ainda no cursinho, associei seu nome com o nome dessa pessoa que conheci e por isso não esqueci seu nome. Memorização por associação. Funciona!

            O ônibus chegou ao meu setor. Ele passou por uma grande poça de água e molhou uma mãe e uma filha que passavam pela calçada. Não pude ouvir o que a mãe disse por causa do barulho do motor e da chuva, mas virei a cabeça pra trás e pude ler seus lábios. Diziam, com todo respeito ao desrespeito: “Fela da puta!”. Então lembrei que desde pequeno me pergunto o motivo de sempre falarem “fela” em vez de filho ou filha. Sempre me perguntei: o que é “fela”? Não sei porquê, mas a partir daí comecei a lembrar dos dois poemas que havia publicado nesta semana, neste blog: Vício Infame e Hábito. Eles tiverem um bom número de acesso e então percebi que o brasileiro gosta de poesia e, segundo o jornalista e escritor Eduardo Bueno, brasileiro gosta de ler sim, desde que o livro não seja caro. Será?

            Daí, lembrei de versos famosos de alguns poetas do nosso país: “Tinha uma pedra no meio do caminho, no meio do caminho tinha uma pedra”. Esses, de Drummond. Também lembrei de versos muitas vezes citados entre e por casais: “Que o amor seja infinito enquanto dure”, de Vinícius de Moraes.

            Desci em um ponto perto do meu prédio. A chuva engrossou. Minha antiga colega de cursinho também desceu e me olhou por um momento, mas desviou o olhar com normalidade. Pensei que não me reconheceu ou então, fingiu que não me reconheceu porque não queria falar comigo. Segui em frente, pensei em falar com ela, mas por quê? Debaixo de chuva e entre o trânsito de 6 horas da tarde? Mas é claro que se eu tivesse feito o contrário, poderia ter começado ali uma grande amizade, mas eu queria mesmo era ir pra casa.

            Corri entre as poças de água das ruas e das calçadas, igual a um Indiana Jones se desviando de armadilha mortais instaladas no chão de algum templo amaldiçoado por deuses malignos. Quando eu estava correndo pela faixa de pedestres, outros transeuntes também correram e terminaram pisando numa poça e jogando água na minha calça. Eu ficaria indignado se aquilo tivesse sido feito por um motorista de carro ou por um piloto de moto, mas não fiquei indignado. Mas não sei porquê não fiquei indignado. Quando vi, já estava na calçada do meu prédio. Havia voltado pro lar doce lar, assim como Ulisses voltou à sua casa após a Guerra de Tróia.

            Porém, antes de entrar em casa, liguei pra uma amiga pra que ela viesse buscar uns papéis que eu havia pegado pra ela. Ela chegou e me contou alguns problemas que, no meio das nossas conversas, chegam a ser engraçados. Adoro ouvir os outros e suas histórias. Algum dia desses junto muitas coisas que eu ouvi e faço um conto, muitos contos, ou um romance. As histórias estão por aí, nas mentes e nas bocas das pessoas. Qualquer dia desses também vou sair pelas ruas abordando o povo: “Oi! Que história cê tem pra me contar?” Um dia desses, o “um dia desses” chegará.

            Subi pro meu apartamento e passei a escrever esta crônica. Apesar da minha intenção, ela nem chega perto de narrar tudo que eu pensava em curto espaço de tempo. O pensamento se esvai muito rápido. O que é pensamento? Ainda bem que existe a escrita, pra registrar com segurança o que pensamos, e a Internet, pra conservar nossos escritos por um prazo de validade indeterminado.

quinta-feira, 22 de março de 2012

Crônicas: Seguindo Viagem

Seguindo Viagem

Por Heitor Gomes Lopes
Numa ensolarada tarde de segunda-feira (05/03/12)
Carolina-MA

Thiago acaba de partir daqui de casa. Diz ele que tem de ir. Parece que a vida lá fora o chama... Alguma coisa assim. Foram 76 dias vendo ele todos os dias, desde o dia 21 de Dezembro de 2011, quando chegou em Brasília com seu violão, suas flautas e um tênis vomitado. Viemos juntos pra Carolina (MA), nossa terra natal.

Dois meses e meio simplesmente pra tocar, trocar músicas, compor, relembrar velhas parcerias, conversar sobre a vida, rever tanta coisa que a gente ama em Carolina.

A gente viveu. Tivemos férias alucinantes, botando em prova o conceito “Carpe Diem” que tão vemos desde os poemas neoclássicos até as músicas de Belchior. Fizemos tudo o que sabemos fazer de melhor, fizemos o que quase ninguém sabe fazer, com muita energia.
Enquanto estávamos aqui, ainda sentíamos saudade de tudo isso que ainda não tinha passado. Tudo isso que pra ele acabou de terminar e que pra mim só durará mais 4 dias.

Vai doer um pouco voltar à vida normal. Parar de mexer integralmente com música, entrar de cabeça no dia a dia que tenta tirar as canções da mente. Mas o Thiago tem uma ideia sobre como lidar com isso.

Ao final dessas férias ele começou a citar muito a frase do Kerouac, “a beleza das coisas deve estar no fato de terminarem”. Isso não me impediu de chorar um pouco na mesa do almoço. Não vai me fazer uma pessoa menos nostálgica. Mas acho válido. O passado, a medida que vai se tornando, vai ficando mais bonito.

A vida passa, os momentos vão virando memória, a gente sempre tem de colocar o pé na estrada e dar adeus às coisas. Quando a vida acaba, simplesmente, a maioria das pessoas se vai sem deixar nada nesse mundo, nenhuma marca. É por isso que vamos deixando nossas músicas por aí. Pra o mundo saber o que a gente fez. Pra o mundo escutar a nossa voz, já que temos algo a dizer.

Tenho de agradecer ao Thiago pelas férias. Pelas músicas, pelo sentimento de ser músico, pelas críticas... Mas principalmente, por deixar na minha memória muita história pra contar. Espero que ele tenha um bom ano, que por onde ele andar fale que somos camaradas e que possamos viver algo parecido com isso “quando o inverno voltar”, como ele diz na canção “Veraneio”.

Que nós sigamos nosso caminho agora, já que temos de viajar, mesmo sem saber se é isso que se deve fazer, se nosso lugar é aqui ou no centro-oeste. É por isso que somos “Andarilhos”, é por isso que somos “Viajante Clandestino”.

Até a próxima vez.


Seguindo Viagem

Por Thiago Damasceno
Numa nostálgica noite de segunda-feira (12/03/12)
Goiânia-GO
           
Passei parte das férias dizendo pra Heitor que faria vários textos sobre aqueles dias e que os postaria no blog. Isso não o impediu de começar a escrever primeiro que eu. Ainda bem, já que seu texto é de uma sensibilidade única e eu estava numa crise de criatividade profunda no campo “prosa”, que acabou agora. Publico os dois textos no mesmo post, pra chegar a “duas visões da mesma história”. Como se vê pelas datas, só consegui escrever algo uma semana após ter partido de Carolina-MA, devido à crise e à minha digestão das coisas....
           
Saí da casa de Heitor por volta das 12h30min daquela ensolarada segunda-feira. Me despedi dos seus pais, que estavam almoçando na casa em frente à sua e depois cruzei a rua pra ir à sua casa me despedir dele. Não precisei entrar na casa de novo, já que ele estava indo almoçar na casa em frente, com seus pais. Nos abraçamos no meio da rua mesmo, debaixo do Sol. Comecei a querer chorar. Ele foi almoçar. Vi que meu MP3 não estava na sacola que eu carregava e voltei pra pegar a chave da outra casa com ele e procurar meu aparelho na residência. Ficamos na calçada e nos poucos segundos em que ele ficou de me dar a chave, encontrei o MP3 enfiado no fundo da sacola que eu segurava. Era o motivo pra eu me despedir de novo e quem sabe, falar algumas coisas, algumas coisas que eu vinha pensando desde metade das férias. Sempre penso em tudo que vou falar e nem sempre falo.

Nos abraçamos de novo e dessa vez, chorei muito. Deformei meu rosto mal barbeado. Expressei toda uma onda de melancolia acumulada há dias. Seus olhos também começaram a lacrimejar e ele começou a dizer algumas que ele pôs no seu texto, algo de “obrigado por me fazer me sentir um músico...” Essas coisas... Eu que agradeço por ele ter arranjado e tocado muitas canções que eu não conseguiria tocar com tamanha qualidade nessa altura do campeonato. Também queria agradecer por todas as noites mal dormidas, consumidas em conversas e trocas de segredos, gargalhas e preocupações existenciais, pelas críticas, brigas e paciência por suportar minha personalidade exigente (e, às vezes, grosseira) na hora de mexer com Arte. Errei e acertei. Talvez mais errei do que acertei, mas o resultado são várias histórias pra contar, um álbum chamado “Cantos Urbanos” e uma amizade mais madura e estável.

Eu queria falar tudo isso na hora, mas não consegui. Me considero escritor, letrista e principalmente, compositor nato, alguns já até me chamaram e chamam de poeta, mas não encontrei palavras pra falar-lhe na hora. Ou melhor, eu até as tinha na ponta da língua, mas não consegui cuspi-las. Eu disse que depois a gente se falava e que eu ia fazer um texto sobre isso... Segui caminhando pela rua, rumo a um beco que me levaria pra longe dali e olhei pra trás, pra vê-lo por uma última vez. Ele estava olhando pra mim, com os braços cruzados, a cabeça erguida como que pra não deixar as lágrimas caírem e os pés firmes no chão, numa pose monumental de quem diz: “E aê, vai encarar?”.

Continuei chorando, mas não por muito tempo. O bendito/maldito Sol secou minhas lágrimas bem rápido. Só fiquei com uma careta de dor e com o rosto vermelho. Uma vermelhidão causada pelo calor do Sol e pelo o aumento do fluxo sanguíneo no rosto.

E por que choramos tanto? Ele mora em Brasília e eu, em Goiânia. Cidades próximas, podemos nos ver algumas vezes. E por que choramos tanto? Acho que não choramos tanto um pelo outro. Amigos que são amigos continuam sendo amigos ao se verem todos os dias ou de 10 em 10 anos. Choramos porque um momento marcante e muito bom havia acabado. Choramos porque explodimos, choramos porque ejaculamos nossas emoções em cada acorde, em cada ritmo, em cada nota cantada em “Cantos Urbanos” durante os 76 dias que nos vemos todos os dias. Foram muitas emoções trabalhadas e arremessadas em músicas. Esse álbum é parte das nossas vidas entre 2008 e 2012, período em que fomos embora de Carolina, nosso mundo seguro e perfeito até então. Período em que o mundo nos deu um tapa na cara e nos mostrou que é mais do que aparece na TV e nos livros.

Assim, aprendemos a falar sobre o cotidiano duro dos trabalhadores brasileiros (Vida de Cão), a desfrutar pequenos prazeres como andar à noite sem destino (Andarilho Noturno), a cantar sobre a terra natal com seus vícios e virtudes (Eu Vim de Longe) e a esperar alguém especial chegar em casa (Velho Silêncio).

Choramos por causa de tudo isso e muito mais. Pelos amigos que perdemos, pelos amigos que fizemos, pelos problemas com entes queridos, pela infância perdida, pelas perdas, pelos ganhos, pelos dias, pelo carpe diem, pelo mundo novo que nos espera aqui e sabe-se lá mais onde. Choramos por saudade, por risos, músicas, poemas, literatura, histórias, filmes, jogos, amores perdidos, possíveis amores futuros, futuro, cachorros, dinheiro, religião, filosofia, por uma gama de fatos, coisas e sentimentos. Choramos pelos 76 dias que talvez não se repitam. Chorei pelo que eu queria que acontecesse e não aconteceu, chorei por causa do Sol escaldante que queimava minha pele.

A cada dia a gente amadurece mais, mas parece que sempre há uma criança querendo que os dias fiquem eternamente iguais, pra ela poder brincar com seus amigos e ter seus brinquedos, seus entes queridos e aproveitar tudo isso como se não houvesse amanhã, mas o amanhã sempre chega. Ainda bem.

Como defende o escritor norteamericano Jack Kerouac, talvez a beleza esteja mesmo no fim das coisas. Então, que eu sempre tenha olhos pra ver o fim delas e a bendita intuição pra farejar pessoas alucinadas e iluminadas que saibam acompanhar isso.

Textos dedicados todos que participaram direta e indiretamente dessa história, a quem viu e ouviu a gente tocando por aí e a quem viu os clipes e baixou as músicas. São muitas pessoas, mas estão todas nas nossas memórias.  

Obs: Agradecimentos especiais a Orlean's Silva, que participou com sua guitarra elétrica na faixa "Geração Coca Zero".

“Dizem que a vida passa, os momentos ficam desvanecidos na memória e o presente fica pra trás... Então, as músicas, vamos deixando por aqui”.
(Heitor Gomes Lopes)

Baixe o álbum completo, gratuitamente:
Viajante Clandestino - "Cantos Urbanos" 

Clipes